Sermão pregado na manhã de Domingo, 17 de Novembro de 1867
Por Charles Haddon Spurgeon
No Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres.
“Com Cristo estou juntamente crucificado, e já não vivo eu, mas vive Cristo em mim; e o que agora vivo na carne, vivo na fé do Filho de Deus, o qual me amou e se entregou a si mesmo por mim”. Gálatas 2:20.
Nas grandes cadeias de montanhas, há elevados picos que tocam as nuvens, mas, por outro lado, há, aqui e ali, partes mais baixas da cordilheira que podem ser trafegadas pelos viajantes e que se convertem em estradas nacionais que propiciam o intercâmbio comercial entre as diversas terras. Meu texto se ergue ante minha contemplação como uma majestosa cadeia de montanhas, como uma verdadeira Cordilheira dos Andes por sua altura. Esta manhã não vou tentar escalar os cumes de sua magnificência; não temos o tempo e tememos que não tenhamos a habilidade para uma obra dessa natureza, mas, até onde minha capacidade permitir, irei guiá-los através de uma ou duas verdades práticas que poderiam ser úteis para nós esta manhã e poderiam nos introduzir aos ensolarados campos da contemplação.
I. Mãos à obra agora. Peço que observem com muito cuidado, em primeiro lugar, A PERSONALIDADE DA RELIGIÃO CRISTÃ tal como é exibida no texto que vamos analisar.
Quantos pronomes pessoais da primeira pessoa há neste versículo? Acaso não são oito? Há uma copiosa presença de “eus” e “meus”. O texto não contém nenhum plural; não menciona ninguém mais, nem uma terceira pessoa situada longe, mas que o apóstolo trata acerca de si mesmo, de sua própria vida interior, de sua própria morte espiritual, do amor de Cristo por ele e do grande sacrifício que Cristo realizou por ele. “O qual me amou e se entregou por mim”. Isso é introdutivo, pois um sinal distintivo da religião cristã é que faz ressaltar a individualidade da pessoa. Não nos faz egoístas, pelo contrário, cura- nos desse mal, mas com tudo isso, manifesta em nós uma identidade mediante a qual nos tornamos conscientes, de maneira eminente, de nossa individualidade pessoal. Nos céus noturnos se tinha observado há muito tempo brilhantes massas de luz; os astrônomos as chamaram de “nebulosas”; supunham que eram depósitos de matéria caótica disforme, até que o telescópio de Herschell as identificou como distintas estrelas. O que fez o telescópio com as estrelas, a religião de Cristo faz com os homens, quando a recebem em seus corações. Os homens se consideram como fundidos com a raça, ou submersos na comunidade, ou absorvidos pela humanidade universal; têm uma ideia muito confusa acerca de suas obrigações independentes para com Deus e de suas relações pessoais para com seu governo, mas o Evangelho, como telescópio, isola o homem frente a si mesmo, faz com que se veja como uma existência separada, e o obriga a meditar sobre seu próprio pecado, sobre sua própria salvação e sua própria condenação pessoal, a menos que seja salvo pela graça. No caminho espaçoso há tantos viajantes, que se vocês lançarem um olhar sobre ele como voo de pássaro, parecerá estar cheio de uma vasta multidão de homens que avança em desordem; mas no caminho estreito que conduz à vida eterna, cada viajante é único; atrai sua atenção; é um homem devidamente identificado. Tendo que ir contra a corrente geral dos tempos, o crente é um indivíduo sobre o qual se pousam olhos observantes. É um indivíduo distinto tanto para ele mesmo quanto para o resto dos de sua classe.